quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Lago Profundo

Sobre o lago profundo
o barco de um outro mundo
imundo
fora do lago profundo
a visão de um outro mundo
imundo
raras pedras
torpes conversas
ao redor do lago profundo
imundo
imundo
afundo
Das noites que caem
sombras das águas saem
Acima do lago profundo
o céu lacrado, apagado
Ao fundo do lago profundo
um sonho calado
encerrado.

Denis Felix

sábado, 3 de dezembro de 2011

Poema da raiva

O Poema da Raiva
Enquanto ri das lágrimas alheias, há quem já saiba.
Acha-te tão esperto, tão a altura. Basta! Besta.
Quem és? Ninguém. E gostas disso: aprecias sofrer.
Bastardo. Ridículo. Quam sabe não gostarás destes elogios também?

Comparo-te fácil com milhares. Fingidos, todos. Básico. Bobo.
Agulha para aliviar-se e enquanto deverias sentir vergonha, ri-se.
Mas não te enganes: é um riso amargo que nunca te fará feliz.
Há de entender um dia que és mesmo incomparável: ri sem graça.

Esses bobinhos que choram por ti hoje, amanhã felizes estarão.
E assim como eu que nunca precisei chorar, rirão.
Percebes que vida inútil tens? Nem cem anos glória te trarão.
Realismo. Realidade. Real. Caçoe todos, abençoe a solidão.


Escrito em 19/12/08.
Simone Schuck às 23:56

domingo, 2 de outubro de 2011

"O Tempo e os Conways" - J. B. Priestley

Apresentações: 13 e 14 de Junho de 2011

O texto de J. B. Priestley, datado de 1937, utiliza o recurso do vai-e-vem temporal para fazer uma incursão sobre o envelhecimento: a jovem Kay, no dia de seu aniversário, ambientado em 1919, prevê o futuro, vinte anos depois, vislumbrando como se transformam as pessoas que a rodeiam. Esse movimento possibilita ao autor jogar com as duas faces de cada figura, estabelecendo interessante diagnóstico sobre as personalidades.

Os Conways são gente simples, ainda que ricos, e possuem traços que toda família classe média possui, razão das identificações que o "espetáculo" buscou captar. Exemplo de um teatro realista que facilmente poderia dar a impressão de desgastado, O Tempo e os Conways evidencia como o apuro técnico e artístico nos desempenhos ajuda a ultrapassar a barreira da temporalidade e projetar no presente um enredo capaz de prender o espectador. O exercício de interpretação deu início a um caminho de aprendizado, de errar e aprender com os erros. Nos deu uma noção de coletivo para que possamos dar continuidade ao longo de nossas carreiras, principalmente para aqueles que pretendem segui-la.
Que venham as próximas e que sejam sempre melhores!

Direção: Fernando Nitsch
Escola Teatro Escola Célia Helena

Amor de Perdição - Camilo Castelo Branco

Trecho de "Amor de Perdição" - Camilo Castelo Branco
(...)As onze horas em ponto estava Simão encostado á porta do quintal, e a distância convencionada o arreeiro com o cavalo à rédea. A toada da música, que vinha das salas remotas, alvoroçava-o, porque a festa em casa de Tadeu de Albuquerque o surpreendera. No longo termo de três anos nunca ele ouvira música naquela casa. Se ele soubesse o dia natalício de Teresa, espantara-se menos da estranha alegria daquelas salas, sempre fechadas como em dias de mortório. Simão imaginou desvairadamente as quimeras que voejam, ora negras, ora translúcidas, em redor da fantasia apaixonada. Não há baliza racional para as belas, nem para as horrorosas ilusões, quando o amor as inventa. Simão Botelho, com o ouvido colado à fechadura, ouvia apenas o som das flautas, e as pancadas do coração sobressaltado(...)

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Um pouco de Kusnet. Grande nome no teatro depois de Stanislavski.

Kusnet, Eugênio (1898 - 1975)

Biografia
Eugênio Chamanski Kuznetsov (Rússia 1898 - São Paulo SP 1975). Mais destacado ator de formação stanislavskiana no teatro brasileiro, criador de papéis marcantes e emérito professor de uma geração de atores nos anos 1960 e 1970.
Nascido na região dos Balcãs, emigra para Moscou onde se forma num dos Estúdios ligados a Stanislavski. Trabalha posteriormente no teatro profissional dos chamados 'países limítrofes bálticos'. Emigra para o Brasil em 1926, onde ocupa-se do comércio e aprende a nova língua. O teatro brasileiro das décadas de 1930 e 1940 não lhe oferece condições de atuação. Em 1951, atendendo um convite de Ziembinski integra o elenco de Paiol Velho, de Abílio Pereira de Almeida, produção do Teatro Brasileiro de Comédia - TBC. Neste conjunto Kusnet pode empregar todo seu conhecimento e compartilhar do acabamento artístico e rigor indispensáveis à plena criação de um papel em nível profissional.
Está nos elencos do TBC de 1951 em Seis Personagens à Procura de Um Autor, de Luigi Pirandello, direção de Adolfo Celi, e Convite ao Baile, de Jean Anouilh, dirigido por Luciano Salce. Em 1952, dirige Maria Della Costa em Manequim, de Henrique Pongetti, produção do Teatro Popular de Arte - TPA. Está em cena em Desejo, de Eugene O'Neill, em 1953 e, no ano seguinte, em O Canto da Cotovia, de Jean Anouilh, montagem de Gianni Ratto que inaugura o Teatro Maria Della Costa - TMDC, e se constitui num trunfo artístico para toda a equipe. Em 1956, está de volta ao TBC, agora sob a condução de Maurice Vaneau, diretor recém contratado pela companhia, em A Casa de Chá do Luar de Agosto, de John Patrick. Seu último trabalho no conjunto é como ator em Os Interesses Criados, de Jacinto Benavente, direção de Alberto D'Aversa, em 1957.
No ano seguinte, integra o conjunto artístico do Teatro de Arena, na produção de Eles Não Usam Black-Tie, de Gianfrancesco Guarnieri, destacando-se como o favelado líder operário Otávio, sendo dirigido por José Renato. Ainda em 1958, figura novamente no TPA, em A Alma Boa de Set-Suan, primeira encenação profissional de Bertolt Brecht no Brasil, interpretando brilhantemente na técnica distanciada, sob a condução de Flaminio Bollini. Em Gimba, novo texto de Guarnieri, volta a fazer um favelado, na encenação que revela o talento do jovem diretor Flávio Rangel, em 1959.
Volta a chamar a atenção em A Visita da Velha Senhora, de Dürrenmatt, ao lado de Cacilda Becker, em 1962. Ainda neste ano, passa a integrar o elenco do Teatro Oficina, nas várias produções efetivadas e ministrando aulas, freqüentadas por atores da companhia e elevada parcela da classe teatral paulistana.
No auge de sua carreira, parte para a Rússia para freqüentar cursos de formação de atores, na Escola Estúdio do Teatro de Arte e na Escola Teatral de Stuchkin, anexa ao Teatro Vakhtangov, ocasiões onde aperfeiçoa seu método de criação do papel e adquire novos conhecimentos ligados aos desdobramentos do método de Stanislavski.
Nessa década, são marcantes seus desempenhos em Pequenos Burgueses, de 1963, vivendo o velho Bessemenov; e em 1966, como o patriarca da família aristocrática flagrada em Os Inimigos, 1966, dois textos realistas de Máximo Gorki, ambos encenados por José Celso Martinez Corrêa. Em 1967, faz sua última aparição nos palcos, na vanguardista montagem de Marat-Sade, de Peter Weiss, encenação de Ademar Guerra onde encarna o aristocrata que assiste o julgamento de Marat.
Kusnet lança-se, a partir de então, à pedagogia, escrevendo sucessivamente dois livros: Iniciação à Arte Dramática e Introdução ao Método da Ação Inconsciente. No início dos anos 1970 eles são fundidos e remodelados, com o título de Ator e Método, uma bem lograda síntese de seus ensinamentos extraídos ao longo de anos de dedicação não apenas à criação de papéis como à transmissão de seu método.
Perguntado sobre o que caracteriza uma boa interpretação, conclui: "A impressão de absoluta verdade. Que não se confunde com a mera imitação da realidade. Porque há uma eterna dualidade nas grandes interpretações: o ator tem de criar uma ilusão quase mágica e ao mesmo tempo nunca perder de vista que está num palco. Há dois extremos a serem evitados: o do ator que se entrega emocionalmente de forma absoluta mas realiza um trabalho esteticamente inconvincente; e o do ator que se deixa levar por um excesso de racionalidade, até extinguir totalmente a paixão em seu desempenho".1
Ao apreciar sua trajetória, a crítica Mariangela Alves de Lima comenta: "suas intervenções, como intérprete ou como teórico, foram sempre delicadas, civilizadíssimas, mas incisivas. Tinha horror ao exagero e à gratuidade exibicionista no gesto ou na fala. As inúmeras observações críticas que descrevem as suas qualidades de intérprete são muitas vezes sinônimo de economia. A amplitude de seu ponto de partida, representar 'o rico e complicado interior do homem', permitiu-lhe transitar do repertório europeizado do Teatro Brasileiro de Comédia para os experimentos mais engajados do Teatro Popular de Arte e, finalmente, para os grupos ideológicos que renovaram a cena paulistana e, por extensão, brasileira".

sexta-feira, 11 de março de 2011

Meu nome é Caio F.

Meu nome é Caio F. Moro no segundo andar, mas nunca encontrei você na escada
Preciso de alguém, e é tão urgente o que digo. Perdoem excessivas, obscenas carências, pieguices, subjetivismos, mas preciso tanto e tanto. Perdoem a bandeira desfraldada, mas é assim que as coisas são-estão dentro-fora de mim: secas. Tão só nesta hora tardia - eu, patético detrito pós-moderno com resquícios de Werther e farrapos de versos de Jim Morrison, Abaporu heavy-metal -, só sei falar dessas ausências que ressecam as palmas das mãos de carícias não dadas.
Preciso de alguém que tenha ouvidos para ouvir, porque são tantas histórias a contar. Que tenha boca para, porque são tantas histórias para ouvir, meu amor. E um grande silêncio desnecessário de palavras. Para ficar ao lado, cúmplice, dividindo o astral, o ritmo, a over, a libido, a percepção da terra, do ar, do fogo, da água, nesta saudável vontade insana de viver. Preciso de alguém que eu possa estender a mão devagar sobre a mesa para tocar a mão quente do outro lado e sentir uma resposta como - eu estou aqui, eu te toco também. Sou o bicho humano que habita a concha ao lado da conha que você habita, e da qual te salvo, meu amor, apenas porque te estendo a minha mão.
No meio da fome, do comício, da crise, no meio do vírus, da noite e do deserto - preciso de alguém para dividir comigo esta sede. Para olhar seus olhos que não adivinho castanhos nem verdes nem azuis e dizer assim: que longa e áspera sede, meu amor. Que vontade, que vontade enorme de dizer outra vez meu amor, depois de tanto tempo e tanto medo. Que vontade escapista e burra de encontrar noutro olhar que não o meu próprio - tão cansado, tão causado - qualquer coisa vasta e abstrata quanto, digamos assim, um Caminho. Esse, simples mas proibido agora: o de tocar no outro. Querer um futuro só porque você estará lá, meu amor. O caminho de encontrar num outro humano o mais humilde de nós. Então direi da boca luminosa de ilusão: te amo tanto. E te beijarei fundo molhado, em puro engano de instantes enganosos transitórios - que importa?
(Mas finjo de adulto, digo coisas falsamente sábias, faço caras sérias, responsáveis. Engano, mistifico. Disfarço esta sede de ti, meu amor que nunca veio - viria? virá? - e minto não, já não preciso.)
Preciso sim, preciso tanto. Alguém que aceite tanto meus sonos demorados quanto minhas insônias insuportáveis. Tanto meu ciclo ascético Francisco de Assis quanto meu ciclo etílico bukovskiano. Que me desperte com um beijo, abra a janela para o sol ou a penumbra. Tanto faz, e sem dizer nada me diga o tempo inteiro alguma coisa como eu sou o outro ser conjunto ao teu, mas não sou tu, e quero adoçar tua vida. Preciso do teu beijo de mel na minha boca de areia seca, preciso da tua mão de seda no couro da minha mão crispada de solidão. Preciso dessa emoção que os antigos chamavam de amor, quando sexo não era morte e as pessoas não tinham medo disso que fazia a gente dissolver o próprio ego no ego do outro e misturar coxas e espíritos no fundo do outro-você, outro-espelho, outro-igual-sedento-de-não-solidão, bicho-carente, tigre e lótus. Preciso de você que eu tanto amo e nunca encontrei. Para continuar vivendo, preciso da parte de mim que não está em mim, mas guardada em você que eu não conheço.
Tenho urgência de ti, meu amor. Para me salvar da lama movediça de mim mesmo. Para me tocar, para me tocar e no toque me salvar. Preciso ter certeza que inventar nosso encontro sempre foi pura intuição, não mera loucura. Ah, imenso amor desconhecido. Para não morrer de sede, preciso de você agora, antes destas palavras todas cairem no abismo dos jornais não lidos ou jogados sem piedade no lixo. Do sonho, do engano, da possível treva e também da luz, do jogo, do embuste: preciso de você para dizer eu te amo outra e outra vez. Como se fosse possível, como se fosse verdade, como se fosse ontem e amanhã.


(Caio Fernando Abreu - Crônica publicada no “Estadão” Caderno 2 de 29/07/87)

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Assistindo a morte

Esse é um tema que detesto colocar em pauta, principalmente num recurso que criei para que fosse de uso leve e descontraido, mas se há uma coisa que ainda me assusta, apesar de todas as crenças, convicções e pq não dizer "achismos" que tenho, essa "coisa" se chama morte. Não gasto muito tempo tentando entender pra onde vamos, se sofremos, se apagamos ou renascemos, apesar de querer acreditar na última teoria (e de fazer meu TCC há alguns anos atrás com esse tema), mas ela é mais questionada por mim do que a própria vida (que tambem é misteriosa em certo ponto). O engraçado é que não penso na minha própria morte, já pensei sim, como todo mundo pensa um dia, mas questiono principalmente a morte alheia, de pessoas próximas e queridas. Sem querer, me pego viajando nas possibilidades e nas mais loucas criações (da minha imaginação) e quem me garante que elas não fazem sentido? Pelo menos pra quem quer acreditar que apesar da dor, está tudo bem. A minha indignação na verdade, se é que posso dizer assim, é o ritual a que todos, ou pelo menos grande parte da população já presenciou que é o velório e o funeral em seu sentido completo. Pq ainda cultuamos um corpo morto? Seria esse ritual necessário ou apenas cultural? Seja lá o que for, não entendo desde criança pq temos que "admirar" o corpo de quem já não respira, não pensa, não está alí. Isso sempre foi pra mim uma prolongação da dor, instantes eternos para que a faca que já está no peito, seja enterrada ainda mais, com requintes de crueldade. Isso não é um desabafo e sim um questionamento, não quero e nem tenho a pretenção de mudar a história e o estilo de velar os mortos ou até levantar a bandeira para o fim disso tudo, me questiono tambem ao fato de comparecer ou não a esses rituais dolorosos, que diferença faz? Será que pega mal perante a sociedade? O amor vai mudar? É uma forma de respeito e última homenagem? Talvez seja tudo isso junto, mas pra mim ainda não serve como conclusão e tampouco me ajuda a encarar essas coisas com mais naturalidade partindo do primeiro instante (o de não saber o que dizer nessas horas, por exemplo). Vi tantas pessoas, conhecidas, amadas, ou não, limitadas num espaço ridículo de um caixote de madeira, fino ou sem luxo algum, sem nada pra oferecer em troca, simplesmente prostradas a mercê da compaixão alheia, da pena, do sofrimento. São horas que não acabam, são instantes de agonia e de apreensão ininterrupta. Daqui pra frente vou tentar poupar meu sofrimento e tentar manter quem eu amo da maneira mais viva na minha cabeça possível, vou tentar não guardar uma fisionomia apática e evitar pensar que o sangue que algum dia correu pelas veias das pessoas queridas, coagulou e que a carne congelou. Me desculpem o papo mega pesado, mas senti vontade de falar sobre isso agora e tentar compartilhar com meus amigos a minha dor de mais uma vez perder uma pessoa querida que teve uma presença (viva) que nunca, jamais vou esquecer. A única pessoa que até hoje, vi morrer de amor. Descanse em paz tia querida, vou pensar em vc como sempre foi e tentar apagar da cabeça o que vc deixou de ser. Te amo!

Quero vc viva na minha memória, nas minhas doces lembranças, pq tenho que ver seu rosto congelado e seu semblante distante? Quero as pessoas vivas, perto ou longe, aqui ou seja lá onde for!